A expectativa do mercado de apostas esportivas no Brasil gira em torno da medida provisória com a regulamentação do setor que está sendo elaborada pelo governo federal, prevendo a cobrança de tributos e estabelecendo regras para operação. As diretrizes da MP foram discutidas nesta quarta-feira, 12, em audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.
Esse debate contou com representantes de entidades do setor de jogos de apostas, loterias, operadores, apostadores, Ministério da Fazenda e parlamentares. O assessor especial José Francisco Manssur, representante do Ministério da Fazenda na audiência pública, abriu a sessão. Ele ressaltou que a medida provisória exigirá capital mínimo dos operadores das apostas, que também pagarão por outorgas. Eles deverão manter domicílio fiscal no Brasil, além de alocar no País parte das equipes e da estrutura.
As apostas esportivas foram criadas pela Lei 13.756/18. “A lei previu pela primeira vez as apostas em prognósticos esportivas, ou seja, as apostas foram trazidas ao ordenamento jurídico por esse texto de 2018, não estão sendo criadas as apostas esportivas agora. O que o governo está fazendo agora é regulamentar, algo que em 2018 foi dado um prazo de 2 anos prorrogável por mais 2 anos para que o poder executivo fizesse essa regulamentação e não foi feito. O que o governo atual está fazendo agora é suprir essa lacuna visando regulamentar essa atividade que mesmo que não regulamentada pelo governo anterior, cresceu exponencial em número de apostadores, em números envolvidos”, disse Mansur.
“O nosso debate foi: qual o instrumento jurídico adequado para regulamentar a atividade? Nós optamos pela medida provisória, porque a partir de nossa consultoria e Procuradoria-Geral da Fazenda para tributar e para aplicar sanções a quem estiver realizando atividade irregularmente, o instrumento jurídico adequado é a MP, e, de nossa parte traz a oportunidade de trazer esse debate ao congresso federal e não fazer por decreto sem a participação do parlamento”, explicou.
O representante do Ministério da Fazenda também comentou a necessidade de portarias, após a MP da regulamentação, para ajustar outras questões pertinentes ao mercado de apostas esportivas. “Manipulação de resultados: ouvimos nos últimos 3 meses os operadores, que sempre foram abertos ao diálogo trazendo as experiências internacionais. Os operadores são vítimas da manipulação de resultados, porque a manipulação quebra a banca. E, trouxeram os mecanismos que existem no exterior mais eficazes. Falamos com a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) para entender como as entidades podem participar, trabalhando em conjunto com o governo federal para evitar a manipulação”, finalizou Mansur.
Operadores e entidades do setor apostas esportivas apoiam a regulamentação
Casas de apostas que operam apostas esportivas a partir de bases no exterior são favoráveis à regulamentação, informaram a Associação Nacional de Jogos e Loterias e o Instituto Brasileiro do Jogo Responsável. Wesley Cardia, CEO da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), falou sobre as alterações na legislação brasileira.
“Essa MP vai interferir ou alterar, ou mexer com toda a legislação que foi editada desde 1997. Um decreto foi feito para regulamentação e prometido durante 4 anos e não saiu, a data limite para que tivesse sido editado foi em 12 de dezembro do ano passado, e infelizmente não ocorreu. O governo atual sabiamente optou por uma MP seguida por portarias do Ministério da Fazenda que permitirão uma adequação precisa, em cima do lance para cada necessidade que for sentida”, argumentou.
“Elementos fundamentais de controle da atividade pelo Estado: somente sites licenciados poderão operar, somente sites licenciados poderão fazer publicidade e patrocínios; as restrições da FIFA quanto a apostas de jogadores, técnicos, etc devem ser reiteradas; sites não licenciados devem ter seu domínio caçado; controle efetivo da Receita Federal, Banco Central e COAF sofre as operações financeiras”, complementou Cardia.
André Gelfi, presidente do Instituto Brasileiro do Jogo Responsável (IBJR), reforçou a necessidade de criar regras claras para o setor. “Enquanto representante da entidade acredito que posso compartilhar a experiência internacional de nossos membros sobre a importância de criar de regras claras para regulamentação do setor, não só para operação de forma segura e legal das empresas, mas também para contribuir com a integridade do futebol brasileiro e garantir a segurança dos jogadores”.
“Desenvolvemos alguns estudos sobre o setor, incluindo o impacto tributário que foi apresentado para o Ministério da Fazenda e membros do Congresso de forma a contribuir para a tomada de decisão sobre o modelo tributário para o setor. Por isso, hoje posso responder as perguntas que fazem referência a nossa experiência de operação em mercados de apostas esportivas regulamentados, informações sobre o que o jogo responsável é e de que forma a regulamentação é benéfica e essencial para o entretenimento seguro, para operadores e jogadores brasileiros”, acrescentou Gelfi.
Marcio Malta, CEO da Sorte Online, fez algumas recomendações relacionadas a obtenção de licenças e tributação da atividade visando dar segurança jurídica aos players. “Uma pesquisa realizada pelo Globo em 2021 demonstrou que 70% dos apostadores de loteria federal são apostadores de apostas esportivas, mas ficamos impedidos de operar nesse mercado pelo nível de segurança jurídica oferecida. Acreditamos que a regulamentação pode gerar mais valor para o estado imediatamente”.
“Essa é a nossa recomendação, diferente de se esperar a disponibilização de licenças para arrecadação tributária, que a arrecadação seja disponibilidade no momento da regulamentação e quem venha a requerer as licenças apresente as guias de impostos pagas e tenha algum tipo de preferência ou prioridade em requerer a licença. Esse é o nosso entendimento para que seja garantida a segurança jurídica e nível de competitividade de quem opera. De quebra, nós entendemos que o interesse do governo em equilibrar contas e aumentar a arrecadação seja cumprido”, completou Malta.
Especialista no assunto, o advogado Roberto Carvalho Brasil Fernandes apoiou as linhas gerais da medida provisória. “Não podemos perder essa oportunidade. A mídia destacou, na palavra do ministro, a expectativa de receita entre 6 e 12 bilhões de reais. Se falarmos de 6 bilhões de reais por ano, estamos falando de 500 milhões de reais por mês. A cada mês que deixarmos de regulamentar essa atividade e ter atividade empresarial exercendo essa função, perdemos de 500 milhões a 1 bilhão de reais, além dos outros benefícios da atividade”.
Ricardo Santos Perassoli se apresentou como representante de aproximadamente 10 milhões de apostadores esportivos de jogo online em todo o Brasil. “Essa é uma atividade séria que sustenta várias famílias, movimenta muito dinheiro e muito emprego também. A gente tem que pensar por que as apostas esportivas cresceram no Brasil? porque estão funcionando e os apostadores conseguem extrair valor, fazer dinheiro de verdade no mercado. Se taxar o apostador para a aposta ganha vai ser um tiro no pé, os apostadores estão prontinhos para ir no mercado offshore. Eu estou sendo sincero bem com vocês, porque não tem como fazer dinheiro, é matematicamente impossível, se taxar o apostador por aposta ganha como na loteria”.
“Nós queremos pagar impostos como todo mundo, óbvio. Só que se cobre do apostador, o imposto sobre o lucro que temos. Agora se eu ganho uma aposta em um jogo e você me cobra o imposto, depois eu perco na outra e isso não é descontado, isso torna impossível a atividade. E, os apostadores, com certeza, irão para o mercado offshore e não tem como fiscalizar isso. Somos a favor da regulamentação, estamos a disposição para falar sobre isso, mas a tributação precisa ser sobre o lucro e não sobre a aposta ganha”, Perassoli.
Aldemar Mascarenhas, representante da Federação Brasileira de Empresas Lotéricas (FEBRALOT), reforçou a necessidade de incluir a Caixa Econômica Federal no debate sobre a atividade. “Eu venho falar de algo consolidado, da rede lotérica da Caixa Econômica Federal, que representamos. Hoje formamos um grupo de 3500 empresas presentes nos mais de 5 mil municípios brasileiros, levando a oportunidade a população mais carente”.
“Estamos consolidados no mercado, fechamos 2022 com a venda só em loterias de 22 bilhões de reais dos quais 48% foram repassados ao Tesouro Nacional, que dá atendimento aos programas sociais do governo. Queremos estar inseridos nesse contexto também porque há uma cultura no Brasil que jogo se faz na casa lotérica. O online está ai, mas precisamos ter a nossa loja física e manter os empregos. Esse é um segmento bem representativo”, concluiu.
Deputados participaram da reunião
O deputado Júnior Mano (PL-CE), que pediu o debate, lembrou que o governo Temer promulgou a Lei 13.756/18, que rege a permissão para o funcionamento dos populares sites de apostas estrangeiros no país. Ainda segundo ele, as grandes casas de aposta recebem um alto volume de dinheiro e, consequentemente, um lucro significativo. O deputado ressaltou que o objetivo da audiência foi esmiuçar a proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que em 1º de março disse que o Brasil deve tributar as apostas esportivas.
Durante o debate, os deputados Bacelar (PV-BA), Newton Cardoso Jr. (MDB-MG), Thiago de Joaldo (PP-SE) e Vermelho (PL-PR) lembraram que a Câmara já aprovou proposta que legaliza todos os jogos de azar no Brasil. No Senado, onde ainda será analisado, o Projeto de Lei 442/91 tramita como PL 2234/22.
Além de representantes de outras entidades empresariais do setor de loterias e também dos apostadores, participaram do debate na Comissão de Finanças e Tributação, presidida pelo deputado Paulo Guedes (PT-MG), os deputados Luiz Lima (PL-RJ), Merlong Solano (PT-PI) e Wellington Roberto (PL-PB).