Apertem os cintos, a lei brasileira dos jogos está acelerando

Nos últimos anos, me tornei um observador atento às reviravoltas que a legalização das apostas no Brasil sofreu. E justamente por ver tudo isso tão de perto, fico tentado a usar uma analogia para descrever o atual momento e tentar criar uma perspectiva factível do que estamos vivendo.

Hoje, temos um Grupo de Trabalho criado pela Câmara dos Deputados, em Brasília, imbuído do espírito de impulsionar o processo regulatório do jogo no Brasil, passando pela análise do Projeto de Lei nº 442/1991.

Este projeto é uma espécie de artefato perdido que a Câmara dos Deputados encontrou dentro de uma gaveta, uma antiguidade deixada para trás pelas administrações anteriores. É como se alguém descobrisse dentro da garagem do avô um Corvette vermelho-cereja ano 1953, esquecido debaixo de uma lona empoeirada.

Neste cenário, o Presidente da Casa Legislativa determinou ao Grupo de Trabalho que fizesse uma limpeza detalhada e a necessária afinação da máquina encontrada. Eles precisam limpar carburador, substituir juntas e borrachas, dar tratamento aos pontos de corrosão e polir o vermelho até volte a brilhar. E é isso que estão fazendo nesse momento. Estão removendo peças indesejadas, acrescentando novas e calibrando itens como tributação.

A única coisa que eu poderia criticar, dentro do senso de justiça ao valioso trabalho desempenhado, é que o Grupo de Trabalho não está conversando com potenciais compradores do Corvette: os operadores do setor.

Infelizmente, isso me faz lembrar de um filme recentemente exibido no Brasil: o caso da Lotex. Naquela ocasião, nosso governo pensou que tinha um carro brilhante, rodando macio e pronto para ser vendido, mas a instalação de um motor não original e de má qualidade fez despencar seu preço de mercado e a compra foi cancelada.

O Grupo de Trabalho é composto por 15 congressistas, que decidiram manter suas portas fechadas para discussões públicas com o setor privado – em última instância, os potenciais compradores. Para ser justo, todos os congressistas têm se mostrado muito disponíveis quando consultados individualmente, mas as deliberações do Grupo, como instituição, permanecem escondidas sob o capô.

Por exemplo, nos dias 20 e 21 de outubro, tive reuniões com os congressistas Bacelar e Felipe Carreras (separados do Grupo de Trabalho), juntamente com Luciana (Hendrich Digital Content), Rui Magalhães e Ana Clara Heeren (ambos do Estoril Sol Digital), onde debatemos sobre antigas preocupações do setor, especialmente relacionadas à tributação e à proteção do consumidor, já que ambos são termos de uma equação racional.

Como professor de direito tributário há mais de 15 anos, tenho uma preocupação especial com o ISS (impostos sobre serviços), imposto municipal e, portanto, sujeito a 5500 regulações distintas.

Naturalmente, os operadores têm sérias preocupações com a tributação (turno-over, GGR, NGR) bem como com a tributação do jogador (uma experiência de insucesso em todas as jurisdições que a implantaram e que estimula o mercado negro, já que oferece ao apostador maiores lucros (não tributados), através de métodos de pagamento “não-conformes”.

Colocamos tudo isso sobre a mesa, juntamente com uma oferta para desenvolver uma audiência pública e um seminário acadêmico, assim como aquele que tivemos a oportunidade de coordenar em 2019, no Rio de Janeiro.

Infelizmente, a oferta foi recusada pelo Grupo de Trabalho. A boa notícia é que foi recusada porque “não havia tempo suficiente para eventos educacionais antes do final do ano”, significando que eles realmente esperavam votar a legislação final antes do final de 2021. O relatório, parte imprescindível, saiu dentro do ano, conforme esperado. Só falta mesmo votarem.

Senhoras e Senhores, a venda do nosso Corvette restaurado está logo ali. Façam suas contas e estejam prontos para dar seus lances.