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A regulamentação dos jogos de apostas está proporcionando diversos debates essenciais para a indústria do iGaming nacional. Muitos jogos e modalidades – como o trade esportivo – estão sendo pautados da seguinte forma: “Será que isso se enquadra como um jogo de aposta?”.

O fundador e CEO da empresa responsável pelo aplicativo appost, Juliano Fontes, assinou um artigo sobre o trade esportivo e as dúvidas existentes acerca dessa atividades.

Nele, Juliano traça um histórico da evolução dos jogos de apostas no Brasil e explica se o trade esportivo faz, ou não, parte dessa indústria.

Confira na íntegra a matéria sobre as apostas no trade esportivo

Entrou na ordem do dia do plenário da Câmara dos Deputados um requerimento para votar em regime de urgência o substitutivo do projeto 442/1991, que trata da regularização do que se convencionou chamar de jogos de azar. A questão sempre foi envolta em polêmica porque sob este guarda-chuva estão colocadas modalidades de todo tipo, desde as loterias, cassinos, jogo do bicho, bingos e as apostas esportivas, o que inclui corridas de cavalos.

A confusão começou há bastante tempo. Mais precisamente em 30 de abril de 1946, por força do decreto-lei 9.215 assinado pelo presidente Eurico Gaspar Dutra, que colocou todos os jogos de azar na ilegalidade. Do popular jogo do bicho aos sofisticados cassinos, que, a exemplo do que ocorre até hoje em Las Vegas, tinham uma atividade cultural intensa paralela às apostas. O prédio do Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, está de pé até hoje para quem tem curiosidade.

O argumento era de que os jogos de azar iam contra a “moral e os bons costumes”. São considerados jogos de azar aqueles que dependem de fator aleatório para determinar os vencedores, o que torna a chance de ganhar muito pequena. Teoricamente, a medida evitaria que as pessoas fossem exploradas ou se arruinassem financeiramente pelo vício no jogo.

Acontece que o argumento da virtude nunca foi muito convincente por uma questão simples: as loterias nunca deixaram de funcionar no Brasil. Surgidas por aqui no século 18, na cidade de Ouro Preto, elas não só sempre foram legais como operadas por empresas privadas escolhidas em concorrência pública. Até 1961, quando a Caixa Econômica Federal passou a administrar todas elas.

Em 1969, o presidente Costa e Silva criou por decreto a loteria esportiva, que só entraria em funcionamento no ano seguinte. As pessoas poderiam apostar nos vencedores (ou no empate) de 13 jogos a cada concurso semanal. Foi bastante popular até o aparecimento da Loto e depois da Mega Sena. Rebatizada em 2002 como Loteca, passou a ter 14 partidas.

Os torcedores e fãs de futebol costumavam se gabar e usar o número de acertos num determinado volante como prova de seu conhecimento dos times e dos campeonatos. A probabilidade de ganhar varia de acordo com a quantidade de duplos e triplos escolhidos na aposta. Com o jogo simples, é de uma em 2.391.485 para 14 acertos e de uma em 85.410 para 13 acertos.

Outro tipo de aposta esportiva, a das corridas de cavalo, nunca foi proibida no país, embora tenha se limitado por muito tempo aos frequentadores dos Jóqueis Clubes, geralmente reservados a uma plateia de elite.

O Trade Esportivo no Brasil

A pergunta que não quer calar é: toda aposta esportiva é um jogo de azar? Não!

Quem lembra daquelas matérias em época de Copa do Mundo na Bolsa de Aposta de Londres? Foram os britânicos que popularizaram a aposta esportiva — que pode tratar desde futebol até modalidades de nicho, como badminton ou corrida de cachorros.

Com a popularização da internet, as casas de apostas foram para o meio virtual, começando pela pioneira Betfair, fundada em 2000 e que hoje é uma empresa de capital aberto sob o nome de Flutter Entertainment com um valor de mercado de US$ 22 bilhões.

De forma muito simples, posso dizer que o trade esportivo é o cruzamento da velha loteca com a Bolsa de Valores. Isso mesmo. A não ser que você considere investir em ações o mesmo que jogar na roleta, dá pra entender que estamos falando de atividades diferentes.

Traders de ações no mercado financeiro não fazem apostas no sentido clássico. A língua inglesa inclusive separa em verbos distintos. Jogar na roleta é gamble, negociar na bolsa é trade. Porque um bom corretor de valores não compra ou vende ações baseado em palpite, simpatia ou feeling. Eles analisam dúzias de relatórios que mostram uma série de indicadores das empresas e testam em modelos matemáticos para prever tendências de acordo com movimentos de mercado anteriores.

O trader de esportes também precisa de informações para escolher uma estratégia. Retrospectos dos times, resultados e número de gols marcados e sofridos como visitantes e anfitriões, desempenho em um número determinado de partidas dentro do campeonato. Dados desse tipo formam tendências.

As “apostas” são feitas uma contra a outra. Quando um sistema aceita seu “palpite” de que o Flamengo vai perder do Atlético-MG, na verdade ele está apostando contra você, ou seja, de que o Galo não vai ganhar. E você também pode apostar uma quantia X no Flamengo e Y no Atlético. Ao contrário do bookmaker de uma mesa de pôquer, apostadores vencedores não são banidos.

Essas posições feitas por várias pessoas diferentes criam uma tendência, aumentando o prêmio para uma determinada posição (digamos, o Galo vencedor). Dá para apostar no time vitorioso, no derrotado, no placar, em expulsões, substituições… O apostador já sabe, quando registra suas posições, quanto poderá faturar em caso de acerto por meio da aplicação de um multiplicador — a quota fixa — do valor apostado.

Da mesma forma que uma casa de investimentos, como XP, Rico ou Vitreo, o objetivo do trader esportivo não é contar com a sorte, mas montar uma estratégia para maximizar o lucro. E da mesma forma que o mercado financeiro conta com consultorias que fornecem relatórios fazendo boas indicações de investimento, no mundo do trade esportivo existem aplicativos que ajudam na montagem da estratégia, como o appost. Ele não concretiza apostas, apenas fornece os dados para orientar o negócio, a aposta.

É claro que estou falando de forma bastante simplificada. Há inúmeros detalhes que não cabem aqui para o propósito dessa análise. Existem grandes flutuações nas possibilidades de ganhos, dependendo da estratégia adotada. Como na Bolsa de Valores.

As apostas esportivas são uma atividade consolidada que cresce a uma taxa de 11,5% ao ano. Em 2020, o mercado global foi avaliado em 59,6 bilhões de dólares. A expectativa é de que atinja os 127,3 bilhões de dólares até 2027. Os dados são da consultoria Grand View Research.

Aqui no Brasil, mesmo com todas as restrições ainda existentes, as apostas movimentaram 7 bilhões de reais no ano passado, a despeito de a pandemia ter paralisado boa parte dos campeonatos, segundo levantamento do portal MKT Esportivo.

Uma prova do potencial desse mercado está nos times que disputaram o Brasileirão. Entre as 40 equipes das Séries A e B, 33 tinham nas camisas patrocínio de casas de apostas.

Atualmente, estamos na seguinte situação: o brasileiro que deseja ser um trader esportivo não está fazendo nada de ilegal, mas os sites precisam estar hospedados no exterior por falta de regulamentação.

A aprovação da Lei nº 13.756/2018, no governo Michel Temer, deu um passo importante no sentido de definir como será feita a distribuição dos recursos apurados com as loterias e reconhecendo a legalidade das apostas chamadas de quota fixa, mesmo que tenha deixado a regulamentação a cargo do Ministério da Fazenda, o que ainda não ocorreu.

Em julho deste ano, o Congresso corrigiu a cobrança de impostos, que agora é por meio do Gross Gaming Revenue (GGR), a diferença entre a arrecadação bruta e a premiação paga, o que é mais um passo na direção certa.

O substitutivo que está em análise na Câmara dos Deputados autoriza os jogos de azar e inclui na Seção VII, art 61 (p. 809 do documento) as apostas esportivas realizadas em locais físicos licenciados (como são as casas lotéricas hoje) ou por sites com servidores em território nacional.

Esta é uma oportunidade de o país gerar emprego, criar mais uma fonte de arrecadação de impostos e mesmo de renda para as pessoas, de forma lícita e orientada por dados. O trader pode ter um perfil mais conservador ou mais arrojado e recebe um prêmio por isso de acordo com determinadas circunstâncias. Azar ou sorte ficam em outro departamento.

Juliano Fontes é uma das maiores autoridades em trade esportivo no país; fundador e CEO da empresa responsável pelo aplicativo appost