Marie Spry é uma figura reservada. Membro da comunidade indígena Ojibwe, que é uma, entre algumas que possuem cassinos nos Estados Unidos. Spry expressa também sua confiança nas mudanças políticas que podem ocorrer nas eleições americanas.
Ela reconhece que a atual vice-governadora de Minnesota, Peggy Flanagan, possui grandes chances de ser a primeira indígena a governar o estado, caso Kamala Harris e Tim Walz sejam eleitos.
A influência indígena nas urnas
Essa expectativa revela uma tendência crescente: as comunidades indígenas estão começando a ter voz e a fazer diferença nas eleições dos EUA. Historicamente, esses grupos foram sub-representados, representando apenas 2% da população nacional.
Entretanto, como destaca o professor Matthew Fletcher, da Universidade de Michigan, esse cenário mudou a partir de 2020, com o aumento do poder de voto dos povos originários em vários estados americanos.
“O movimento começou principalmente em Estados como Arizona, Novo México, Oklahoma, Dakota do Norte e Dakota do Sul. Pois nessas regiões as populações indígenas têm um papel crucial nas decisões eleitorais”, diz Fletcher.
Ele explica que a maioria das comunidades indígenas tende a apoiar os democratas, que costumam favorecer políticas voltadas para a expansão das reservas. Isso se deve a uma longa história de aliança entre esses grupos e o partido.
Cassinos se tornaram uma fonte crucial de renda para povos indígenas nos EUA. Mas, embora estados como Minnesota proíbam esses estabelecimentos, comunidades indígenas mantêm o direito de operá-los, conforme decisão da Suprema Corte em 1987. Esse avanço ajudou a combater a pobreza entre essas populações, destaca Thomas Klemm, doutorando em política americana.
Portanto, os primeiros cassinos começaram como casas de bingo simples e, com o tempo, evoluíram para estabelecimentos maiores e organizados. Segundo Klemm, essa expansão aumentou a renda e a qualidade de vida das comunidades indígenas, impulsionando a economia local.
Desafios e oportunidades dos cassinos
Assim, embora a presença dos cassinos tenha proporcionado um avanço para algumas comunidades, nem todas têm acesso ou obtêm lucros significativos. “Apenas 10% dos cassinos indígenas são realmente lucrativos”, afirma Fletcher.
No entanto, essa minoria tem conseguido transformar a vida de muitas famílias. Na comunidade de Spry, por exemplo, as receitas do Grand Portage Casino fornecem recursos para os membros da comunidade. Os jovens recebem um bônus ao completarem 18 anos, se formarem no ensino médio, num valor estimado em US$ 100 mil.
As dificuldades no acesso ao voto, no entanto, são um desafio persistente. Membros de comunidades como a de Klemm enfrentam obstáculos para se registrar e votar. A exigência de documentos em alguns estados, como Arizona e Oklahoma, torna o processo ainda mais complicado.
Klemm enfatiza a complexidade da identidade indígena na política, ressaltando que, muitas vezes, as pessoas não se identificam com o sistema federal, considerando suas nações soberanas.
“Cresci com pessoas que não acreditam em votar. Para muitos, o voto é direcionado às nossas autoridades, não ao governo federal”, relembra. Apesar disso, há um crescente reconhecimento da importância do voto para garantir direitos e benefícios sociais mais amplos.
527 cassinos administrados por 245 tribos indígenas nos EUA
Tanto as comunidades de Spry quanto de Klemm apresentam uma grande diversidade de opiniões sobre as eleições. Mas, embora alguns respeitem as declarações de Joe Biden sobre o apoio aos povos indígenas, outros ainda têm dificuldades para confiar completamente nos políticos, independentemente de seu partido.
Gary Bohnee, representante da comunidade Salt River Pima-Maricopa, afirma que os povos indígenas aprenderam a dialogar com ambos os partidos para alcançar seus interesses.
“É crucial que os políticos se importem verdadeiramente com as questões indígenas”, ressalta Bohnee. Para ele, o suporte a essas comunidades não deve depender da afiliação partidária, mas da seriedade das propostas apresentadas.
Nas últimas eleições, a comunidade Salt River Pima-Maricopa doou US$ 224 mil a democratas e US$ 89,2 mil a republicanos. Esse engajamento reflete a busca das comunidades indígenas por influência política e participação nas decisões que impactam suas vidas.
Nos EUA, 527 cassinos administrados por 245 tribos indígenas mostram a força política dessas comunidades. Além de gerar receita, esses cassinos criam empregos e fornecem serviços vitais, como saúde e educação, fortalecendo sua autonomia financeira e aumentando sua influência nas eleições.
O engajamento político das comunidades indígenas expressa uma longa luta por direitos e reconhecimento. A ascensão de líderes indígenas, como Deb Haaland no Departamento do Interior, mostra que as demandas das populações originárias ganham força no cenário político, refletindo um avanço significativo.
Perspectivas para o futuro
Com as eleições se aproximando, o desafio é remover barreiras ao voto indígena. Iniciativas de educação cívica e advocacy buscam conscientizar as comunidades sobre a importância de sua participação. Medidas como a tradução de cédulas para línguas nativas e a flexibilização de exigências de identificação também são essenciais para ampliar essa participação.
A mobilização nas redes sociais e o fortalecimento de coalizões com organizações que trabalham em prol dos direitos civis dos povos originários são estratégias que podem aumentar a visibilidade das questões indígenas nas eleições futuras.
“O futuro político das comunidades indígenas está se moldando, e a participação ativa no processo eleitoral pode ser a chave para garantir que suas vozes sejam ouvidas em níveis mais altos de decisão”, conclui Bohnee.