Manipulação de resultados: Romário quebra silêncio e fala sobre participação em esquema com apostas
Manipulação de resultados: Romário quebra silêncio e fala sobre participação em esquema com apostas

O jogador Romário, apontado pelo Ministério Público (MP-GO) como um dos envolvidos na manipulação de resultados na Série B, quebrou o silêncio em uma entrevista nesta segunda-feira, 6. O volante, que já jogou pelo Vila Nova, admitiu ter cometido um erro ao aceitar dinheiro e participar do esquema de apostas.

Romário nega ter concordado em cometer um pênalti proposital no jogo Vila Nova x Sport e alega que, na época, não estava mais inscrito na competição após uma negociação frustrada para os Emirados Árabes.

No entanto, ele admitiu ter passado o contato de outro jogador, Gabriel Domingos, ao suposto aliciador Bruno Lopez de Moura, empresário preso na operação “Penalidade Máxima”, que investiga a manipulação de resultados na Série B. Moura foi solto após um habeas corpus.

“Meu erro foi ter aceitado o dinheiro deles. A todo momento eu falava para eles que não iria fazer, até porque eu não poderia jogar. Continuaram insistindo e mandaram eu passar contatos de outros jogadores do Vila. Essa foi minha participação”, disse o jogador.

Diferentemente da afirmação do MP-GO, Romário argumenta que Domingos não apenas disponibilizou sua conta para as transações bancárias, mas também tinha conhecimento do esquema de manipulação de resultados conduzido por Bruno Lopez de Moura.

“Eu não recebi os R$ 10 mil. Ele (Bruno) antecipou R$ 10 mil, mas R$ 5 mil ficaram para mim e R$ 5 mil foram para o Domingos”, acrescentou.

De acordo com a investigação realizada pelo MP-GO, Bruno persuadia os jogadores a manipular os resultados das partidas através de táticas como cometer pênaltis durante o primeiro tempo dos jogos.

Como recompensa, os atletas receberiam uma fração dos prêmios das apostas. Cada indivíduo envolvido no esquema de manipulação de resultados seria remunerado com R$ 150 mil por aposta.

Confira a entrevista sobre manipulação de resultados com Romário na íntegra

Qual foi sua participação no esquema de manipulação de resultados?

– Meu erro foi ter aceitado o dinheiro deles. A todo momento eu falava para eles que não iria fazer, até porque eu não poderia jogar. Eu tinha ido para os Emirados e quando voltei a janela estava fechada. Falei isso para eles. Continuaram insistindo e mandaram eu passar contatos de outros jogadores do Vila. Essa foi minha participação.

Como eles chegaram até você?

– Eu tinha um parceiro, de São Paulo, que eu comprava roupa dele. Esse parceiro conhecia o Bruno. O Bruno chegou até mim por meio dele. Um dia ele me ligou à noite falando disso (cometer pênalti). Eu falei que não iria fazer. No outro dia, apareceu o Bruno. Eu passei o número de outro jogador do Vila, que era o Domingos. Não sei o que os dois conversaram. Recebi uma parte só por ter passado o contato para ele.

O sinal de R$ 10 mil foi só por passar o contato?

– Sim, mas eu não recebi R$ 10 mil. Recebi R$ 5 mil. Ele (Bruno) antecipou R$ 10 mil. R$ 5 mil ficou para mim e R$ 5 mil foi para o Domingos.

Ele então não apenas emprestou a conta?

– Não, ele estava ciente já.

Por que o Vila Nova não rescindiu com ele?

– Não sei. Não sei se o Hugo (presidente) sabe essa história.

Você concordou em fazer o pênalti?

– Não. Em nenhum momento.

Te explicaram como funcionava o esquema?

– Sim, ele (Bruno) chegou a me mostrar vídeo de outros atletas fazendo. Só que hora nenhuma eu aceitei fazer isso. Sempre falei que não iria fazer, tanto é que eu não poderia jogar. Eles já sabiam que eu não podia jogar. Meu erro foi passar o contato de jogadores do Vila para ele.

Por que você passou o contato do Domingos?

– Passei de vários. Não foi só do Domingos. Só que ele (Bruno) foi logo no Domingos.

Em uma conversa por aplicativo com o presidente do Vila, ele te pergunta “como você foi entrar nessa?” Como foi?

– Foi na hora que eu acabei passando o número. Nem devia ter passado. Mas já estava com bastante raiva e acabei passando. Mas hora nenhum eu quis prejudicar o time.

Você acha que dá pra fazer pênalti sem parecer que foi proposital?

– Acho que dá. Mas vai muito pelo caráter da pessoa.

Você nunca fez um pênalti de propósito?

– Não.

Nunca tomou cartão amarelo de propósito?

– Não, nunca.

Fez escanteio?

– Também não.

Nunca participou de esquema de manipulação de jogos?

– Nunca.

O Domingos aceitou participar?

– Eu não tive acesso às conversas dele com o Bruno. Tive uma ligação de vídeo com os dois, mas fiquei só ouvindo. Conversa mesmo, não tive.

Você tentou convencer o Domingos a fazer pênalti?

– Não. Eu tentei convencer outros jogadores quando o Domingos falou que não iria fazer mais. Porque eu ficava recebendo ameaça do Bruno. Ele ficava falando que se não acontecesse o pênalti ele iria fazer coisa e acabar com a minha carreira. Aí tentei convencer outros jogadores, mas hora nenhuma quis prejudicar o time.

O que você tinha que fazer?

– Tinha que passar um número, e ele (Bruno) iria convencer a pessoa.

Você falou com a diretoria?

– Sim, eu cheguei a contar para o Hugo por ligação o que estava acontecendo. Ele me ligou, eu já estava de férias e conversei com ele. Falei como tinha acontecido.

Se você tivesse ido para o jogo, você teria feito o pênalti?

– Acho que não. Pela história que tenho no Vila, acho que eu não faria. Eu só estava grilado no momento porque não estava jogando, mas acho que eu não teria aceitado.

Foi a primeira vez que um apostador te procurou?

– Sim.

O que você acha dessa relação: futebol x apostas?

– Nunca deu certo isso aí. Nunca vai dar.

Você faz apostas esportivas?

– Faço bastante. Mas só time de fora, da Espanha. Nunca participei de nenhum tipo de esquema.

Você aposta em escanteios, pênaltis?

– Não. Só nos times mesmo, em quem vai ganhar.

O que o apostador te prometeu?

– De começo, ele conversou comigo sem saber que eu não poderia jogar. Falou que mandaria R$ 10 mil de sinal e depois pagaria R$ 140 mil. Ao todo, era R$ 150 mil.

Foi aí que você ficou tentado a participar?

– Não. Eu já tinha falado que não iriar fazer. Ele fez a proposta, mas eu disse que não. Aí ele aumentava, pulava para R$ 200 mil. Eu continuava falando que não iria fazer. Aí foi quando ele pediu o contato de algum jogador do Vila e eu mandei para ele.

Você estava precisando de dinheiro?

– Não. Hora nenhuma eu passei aperto. Nunca passei dificuldade assim, muito alta. A chegar ao nível de fazer isso.

O Domingos te repassou o dinheiro?

– Sim. E eu repassei de volta para o Bruno o sinal. Eu já tinha gastado, mas mandei algumas mensagens, recolhi um dinheiro e devolvi para o Bruno. Mas aí ele ficou fazendo ameaças pelo valor que ele perdeu na aposta. Ele fala que ganharia milhões. O valor que ele estava me cobrando era R$ 500 mil, que ele usou na aposta.

Como você está hoje?

– Fico com medo de acontecer alguma coisa com a minha família. Minha mãe e minha esposa ficam com medo. Só ficamos dentro de casa. Estou parado, sem jogar. Fico agoniado, só dentro de casa.

Do que você tem medo?

– De virem atrás da minha família. Ele, o Bruno.

As pessoas envolvidas são perigosas?

– Esse apostador (Bruno), sim.

Fizeram ameaças? Quais?

– Sim. Falaram que se não acontecesse o pênalti, eles iriam vir cobrar. Depois que passou o jogo continuaram falando que mandariam gente aqui em Goiânia para fazer alguma coisa comigo. Tive que ir para o interior por causa disso.

Depois que foi preso e solto, o Bruno te procurou?

– Não. Depois disso, ele sumiu.

Você quer voltar a jogar futebol?

– Sim. Espero ser considerado inocente. Não tenho nada a ver. Tem conversas provando que a todo momento eu falei para eles que não iria fazer. Tanto é que nem aconteceu o pênalti. Jogadores que teriam feito (Joseph e Matheusinho) estão jogando, e eu estou parado. Veio tudo para cima de mim. Fui considerado o cara da aposta, mas não tenho a ver.

Quem tem a ver?

– O apostador.

Quem mais?

– Ele mostrava bastante vídeo dos caras fazendo isso para ele, mas nesse dia ele falou só do jogo do Vila. Ele não falou de outros jogos.

Para o esquema dar certo, dependia de outros dois jogos. Você falou com os demais jogadores envolvidos?

– Não. Eu nem sabia que eles estavam envolvidos. O Bruno só falou sobre o pênalti no jogo do Vila. Dos outros, ele não chegou a falar.

Depois você foi para o Goiânia. Como foi lá?

– Foi tranquilo. Os caras me receberam bem. Já sabiam o que estava acontecendo. Falei para o presidente, mas ele optou pela minha contratação. Fui elogiado por eles. Todo jogo era elogiado pelo meu caráter e meu dia a dia.

Por que saiu do Goiânia?

– Porque recebi uma proposta melhor (Athletic-MG) para mim e minha família. Conversei com eles depois do jogo contra o Anápolis. Eles falaram que me liberariam.

Você acha que essa história pode acabar com sua carreira?

– Acho que não. Estou novo ainda. Posso voltar depois do que o juiz decretar, se vou pegar punição ou não. Acredito que não pego punição. E devo continuar minha carreira.

Onde? Você tem propostas?

– Fora do Brasil. Sim, de um time de Portugal. O que eu quero hoje é sair do Brasil.

Você se arrepende?

– Sim, bastante. Era para eu estar no Vila até hoje.