As apostas esportivas estão ganhando cada vez mais popularidade no Brasil. Neste ano, os torcedores dos 20 clubes participantes da Série A do Campeonato Brasileiro se acostumaram a enxergar publicidade de casas de apostas nos uniformes dos jogadores, em placas de publicidade nos gramados ou em anúncios durante as transmissões das partidas.
Vale lembrar que em dezembro de 2018 entrou em vigência a lei 13.756/2018, que legalizou a exploração comercial privada da atividade no país. Desde então, o mercado aguarda ansiosamente a conclusão do processo de regulamentação das apostas esportivas no país. O prazo se encerra em dezembro deste ano, quando também ocorrerá a Copa do Mundo.
Em artigo publicado recentemente na Folha de São Paulo, o advogado Bernardo Cavalcanti Freire apresenta um contexto histórico das apostas no Brasil e defende a regulamentação do mercado. Para Freire, “sem essa regulamentação, todos os que têm interesse em investir no setor, a sociedade e o governo perdem”.
Abaixo, confira o artigo da Folha de São Paulo na integra:
As apostas esportivas eletrônicas devem ser regulamentadas? SIM
Algumas discussões referentes a certas atividades empresariais apontam que o Brasil continua estagnado no século 20. Um exemplo são as apostas esportivas eletrônicas, sobre as quais é importante trazer o contexto histórico mais recente.
Na década de 1930, houve considerável interesse no fomento do turismo no país. O presidente Getúlio Vargas apoiou a abertura de cassinos e liberou apostas, o jogo do bicho e afins. No entanto, no Estado Novo, todas as apostas, dentre elas as esportivas, acabaram sendo tipificadas como contravenção penal pelo decreto-lei 3.688/1941. Por outro lado, para compensar a nova lei, Vargas criou uma ampla lista de exceções, incluindo as casas de jogos anteriormente licenciadas.
A proibição definitiva ocorreu em 1946, com o decreto-lei 9.215/1946. Estima-se que a proibição gerou mais de 55 mil desempregados, com o fim de mais de 70 estabelecimentos. A lei tinha por objetivo vedar contravenções que não seriam graves o suficiente para serem tipificadas dentre os crimes previstos no Código Penal de 1940. A proibição das apostas é atribuída à vontade da mulher do presidente Eurico Gaspar Dutra, Carmela Dutra, a dona Santinha. Muito religiosa, exigiu que o marido proibisse a jogatina. O fato é que, após quase 80 anos, a Lei de Contravenções Penais continua vigente.
Sobre apostas esportivas, em dezembro de 2018 entrou em vigor a lei 13.756/2018, que legalizou a sua exploração comercial privada em todo o território nacional. A lei autoriza a modalidade lotérica denominada como “apostas de quota fixa”, para eventos esportivos em geral e equiparados, em que o apostador tem uma previsibilidade de quanto pode ganhar ou perder, de acordo com a sua aposta. Exatamente o que ocorre com as apostas esportivas.
A legalização das apostas esportivas foi celebrada por empresários dos mais variados setores, brasileiros e internacionais. Para se ter uma ideia da importância da regulamentação, na Inglaterra, onde as regras são as mais rigorosas do mundo, o faturamento com as apostas esportivas atinge cerca de R$ 27 bilhões ao ano, com uma arrecadação fiscal de mais de R$ 4 bilhões, segundo a UK Betting and Gaming Statistics. Estudo da Grand View Research prevê que, até 2030, o mercado global de apostas esportivas deve movimentar mais de US$ 180 bilhões.
Aqui, após quase quatro anos, apesar da legalização da atividade, seguimos sem regulamentação. A morosidade da organização do setor traz prejuízos a todos, além de insegurança jurídica aos interessados em investir. O cenário atual gera diferentes interpretações sobre as regras e os impostos incidentes, o que resultará numa série de demandas judiciais e questionamentos sobre a regularidade das operações.
A solução é simples: regulamentar e garantir o respeito à lei 13.756/2018 no prazo legalmente previsto. Até porque, por óbvio, a lei somente poderia ser revogada em nova votação no Congresso Nacional.
O governo federal deve providenciar a regulamentação das apostas esportivas, garantindo e legitimando os empresários que há anos esperam para investir numa atividade já tão importante no apoio ao esporte brasileiro em diversas modalidades.
É preciso regulamentar as apostas esportivas no Brasil. Sem essa regulamentação, todos os que têm interesse em investir no setor, a sociedade e o governo perdem. É como se, nesse tema, o Brasil estivesse nos anos 1940, sujeito à vontade pessoal de dona Santinha.