Há quatro anos, o Brasil começava o processo para a legalização do mercado de apostas esportivas com a Lei nº 13.756/2018, que ainda está em trâmite por conta dos atrasos gerados pela pandemia da Covid-19.
Porém, é notável a grande evolução da modalidade no cenário nacional, com diversas empresas se introduzindo na economia do país e buscando maneiras de atrair ainda mais clientes.
Para isso muitas marca do setor fecharam parcerias com clubes e ícones do futebol brasileiro, conseguindo se aproximar dos torcedores e fãs de uma forma mais eficiente e direta. Atualmente as casas de apostas patrocinam 19 dos 20 clubes clube da Série A do Brasileirão.
Mas algo que não foi previsto na Lei nº 13.756/2018, são os limites que as casas de apostas têm para a exploração publicitária de marcas e imagens do esporte. O ConJur publicou recentemente um artigo de opinião que debate o tema e ressalta a sua importância para manter o mercado de apostas esportivas mais seguro e justo. O artigo foi escrito por André Carvalho Sica, André Thomas Fehér Junior e Alice Maria Gallian.
Confira abaixo o artigo de opinião sobre as apostas esportivas na íntegra
A Lei nº 13.756/2018, sancionada há quatro anos, legalizou o mercado de apostas esportivas no Brasil, condicionando, porém, em seu artigo 29, a regulamentação da atividade à posterior normatização pelo Ministério da Fazenda, que deveria ocorrer até 2020. Ocorre que, em decorrência da pandemia do Covid-19, bem como discussões acerca dos dispositivos da referida Lei, tal prazo foi prorrogado até o final de 2022, de modo que a expectativa é que a regulamentação seja aprovada ainda este ano.
Um dos importantes temas a serem abordados na iminente regulamentação seria a respeito dos limites da exploração pelas empresas do mercado de apostas esportivas das marcas, imagens e emblemas das entidades de prática desportiva, atletas das mais diversas modalidades. Não há hoje, no texto da Lei nº 13.756/2018, qualquer disposição sólida a esse respeito.
A urgência em se enfrentar este assunto na legislação se justifica ao observarmos nos programas de televisão, rádio, redes sociais, plataformas de streaming, as empresas de apostas esportivas se apropriando indistintamente e indevidamente das marcas dos atores do mercado do esporte sem qualquer tipo de autorização.
Tais práticas configuram clara violação ao artigo 87 da Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé) que assegura 1) às entidades de prática desportiva proteção quanto às suas marcas, dentre as quais sua denominação e símbolos, independentemente de registro, garantindo-lhes o direito de uso comercial, bem como 2) aos atletas profissionais, os direitos relativos aos direitos de sua imagem, incluindo os nomes, denominações, símbolos e apelidos desportivos.
Inexistindo quaisquer acordos comerciais entre as empresas do mercado de apostas esportivas, as entidades de prática desportiva e/ou atletas, tal prática configura, além de desprestígio comercial, contrafação de marca e concorrência desleal, nos termos do artigo 5º, VII, da Lei Federal nº 9.610/98 e dos artigos 189 e 195 da Lei Federal nº 9.279/96.
Ainda, sob um olhar atento ao que prevê a regulamentação do mercado publicitário, o aproveitamento de tais propriedades sem o devido licenciamento, configura prática de “marketing de emboscada”, amplamente vedado pela legislação pátria. É, inclusive, o que prevê o Código de Autorregulamentação Publicitária (Conar) em seu artigo 31, que proíbe, expressamente, proveitos decorrentes da prática métodos de publicidade que sejam indevidos e ilegítimos.
Há quem defenda, porém, que a cessão dos direitos sobre as marcas das entidades de prática desportiva estaria prevista e protegida na Lei 13.756/2018, especificamente em seus artigos 17, inciso I, item i, 18, inciso I, item h, 20, inciso V, 22, VIII e IX, 30, §1°, inciso III, que prevê o benefício fiscal de entidades de prática desportiva que cedessem os direitos das propriedades sobre suas marcas para divulgação e execução da loteria de apostas de quota fixa.
Entretanto, ao observar atentamente as previsões legais mencionadas, não existe qualquer obrigatoriedade de as entidades de prática desportiva realizarem tal cessão. Trata-se de uma faculdade, em contrapartida a benefícios fiscais. Consequentemente, não havendo a intenção expressa de a entidade desportiva realizar a referida cessão, a problemática da utilização indevida das propriedades das marcas dos clubes e dos atletas subsistiria.
Não menos importante, vale mencionar que os referidos artigos nada falam sobre a utilização dos direitos das imagens dos atletas por parte das empresas de apostas esportivas. Portanto, não havendo o respectivo licenciamento de uso de tais direitos de imagem, estes não poderiam ser veiculados de maneira alguma pelas empresas de apostas, por se tratar de direitos personalíssimos, constitucionalmente protegidos.
Dessa forma, certo é que, para ampliar a segurança do mercado desportivo, e tornar ainda mais clara a proteção às marcas e imagens de clubes e atletas, faz-se necessário que a regulamentação a ser implementada pela Lei 13.756/2018 enfrente tal tema. De qualquer forma, enquanto a regulamentação não chega, é necessário que as empresas de apostas esportivas se adequem e observem os claros dispositivos que já se encontram nas legislações já existentes. Caso contrário, a prática de suas atividades poderá ser passível de responsabilização civil e criminal, além de impedidas de atuar no país.